A falta que me fazem
Os meus amigos são tão poucos e às vezes
um a um quase me esqueço de lhes dizer
a falta que me fazem como quando
por exemplo numa sexta-feira à noite eu entro no café
e a cerveja nem me sabe nem o caralho
A alegria é cada vez mais com a passagem
dos anos essa ave rara que só numa corrida com os
filhos num bosque de bétulas ou
numa tarde de domingo a desenhar com
eles um satélite ou num passeio à
noite na areia molhada da praia nas marés do
equinócio de forma imprevista
verdadeiramente
pode visitar-nos.
Mas esta de que falo só com os meus
amigos e
é inominável que dizer dessa paz imensa
dessa felicidade quase sem imagens que é
sentarmo-nos à roda de uma
mesa e nem dizermos nada.
Os meus amigos são tão poucos que é
quase um
crime
separarmo-nos assim deixarmos que às
vezes um número de telefone um círculo vermelho
a marcador no mapa do acp
uma carta sejam o mais que pode trazer às
nossas vidas essa ilusão de pertencer-nos o
mundo todo de não haver uma mulher uma
estrela uma que não sejam
nossas para sempre.
Os meus amigos são tão
imensos que
às vezes apetece-me deixar o computador
ligado a meio da tarde meter-me no carro pagar
a portagem da auto-estrada
permanentemente em
obras de conservação e procurá-los com
a agenda aberta nos seus nomes e acordá-los
antes da alba só para lhes dizer
a falta que me fazem.
Poema de José Carlos Barros
In Poema Poema – Antologia de Poesia Portuguesa Actual.
Ed. Uberto Stabile, Punta Umbría, Huelva, 2006.
7.3.06
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